segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Na véspera da cirurgia

Na véspera, tive de me apresentar no hospital para tratar de todos os procedimentos para a cirurgia.  Primeiro que tudo, a auxiliar que me recebeu começou a dizer cheia de boa disposição e em tom de brincadeira que eu me devia ir embora enquanto era tempo, porque aquilo não era sítio para uma rapariga tão bonita, tão nova e com um aspecto tão saudável. Era bom que assim fosse, mas infelizmente e apesar de não aparentar estar doente (em parte graças também à maquilhagem com que uma pessoa disfarça olheiras e afins), a verdade é que tinha dentro de mim aquela bicheza toda e eu só queria ver-me livre dela. Mas quando entrei naqueles corredores do quinto piso do IPO respirei fundo e vi que não ia ser de todo fácil.

O quinto piso que abrange a área dos tumores de cabeça e de pescoço não é de digestão fácil. É que uma coisa são os males que não são tão visíveis, outra são aqueles que não dão para esconder, a não ser que se esconda a cara. De repente, dava por mim a espreitar para aqueles quartos e só via pessoas sem partes da face, sem maxilares, sem narizes, outras que não podiam fechar a boca porque a língua estava gigante e cheia de cortes, outras com cicatrizes que iam de uma ponta à outra da cabeça e uma imensidão de gente com buracos no pescoço que lhes permitiam falar e comer, fruto de traqueotomias. Eu confesso que fiquei apavorada com todo aquele sofrimento.

A dra Mariluz Martins que me recebeu, e que é simplesmente do mais querido que há, disse-me para eu ficar tranquila e que nada iria correr mal. Iria ser operada pela melhor equipa do país neste tipo de tumores e as coisas só podiam correr bem. Tranquilizei, mas só pensava naquelas pessoas que ali estavam. Por que é que certas pessoas têm de sofrer tanto, pensava eu. Comparada com aquelas pessoas, sentia-me uma sortuda. Ou não. É que ali acabei por conhecer pessoas inspiradoras com vidas tão difíceis , mas que ao mesmo tempo mantinham uma alegria de viver tão grande, que me faziam sentir pequena em todos os aspectos. Foi, sem dúvida, uma lição de vida para mim tudo aquilo que ali vivi.

2 comentários:

Paula disse...

Olá. Conheço tão bem, infelizmente a sensação bementrar no serviço de cirúrgia "cabeça e pescoço" e perceber que, por pior que seja a nossa situação, há sempre alguém a sofrer mais.

Bailarina disse...

Só te consigo enviar um grande abraço