quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Planeamento da radioterapia
















Depois de ter recuperado totalmente daquela ida ao dentista, fui fazer o planeamento das sessões de radioterapia. Foram identificados os locais exatos onde as radiações iriam incidir através de tomografias (para isso estive uma imensidão de tempo deitada com as máquinas a passarem) que posteriormente seriam enviadas para médicos e físicos que iriam fazer o planeamento das sessões.
Como o tumor a atacar era na zona do pescoço, fui ainda fazer o molde da máscara  (do género da da imagem, mas um pouco mais comprida na zona do pescoço) que iria usar durante todas as sessões para melhor proteção das áreas onde as radiações não deveriam chegar.

E eu só pensava, claustrofóbica como sou, como é que iria aguentar todas as sessões com aquela coisa a apertar e a tapar a minha cara?

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Depois da tempestade, a bonança

Para contrariar o sofrimento daquela ida ao dentista, a recuperação foi ótima. No próprio dia custou bastante, é certo. Eu não tive dores nenhumas, mas o desconforto era total. Sobretudo aquela parte do sabor a sangue na boca. Sentia-me uma vampira. E a parte da fome? Só eu sei a fome que passei nesse dia. Comi apenas dois iogurtes e um pratinho de cérelac. Mas depois foi sempre a melhorar. Comecei a comer aos poucos. Tomei a medicação. Punha, de vez em quando, um saquinho de gelo (ou de milho congelado, como foi o meu caso) na cara. E de repente fiquei bem. Ao fim de dois dias já eu estava num concerto da Madonna e ao fim de uma semana já os pontos estavam a cair e eu ia novamente ao IPO para mais uma consulta de preparação para a radioterapia.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Ida ao dentista (também conhecida como ida ao mundo do horror)

Depois de ter feito uma radiografia geral aos dentes e de me terem dito que possivelmente dois sisos teriam de saltar fora, apresentei-me no IPO no dia 12 de setembro de 2008 para fazer esse agradável servicinho. Eu ia a modos que apavorada e já a pensar que não iria ser fácil, mas a coisa foi mil vezes pior do que eu imaginava. 

Afinal, não eram dois sisos que iam saltar fora, eram três. E isto porque eram dentes que poderiam dar problemas durante ou após a radioterapia. E, para evitar que isso acontecesse e uma vez que durante um longo período de tempo não se podem tratar dentes devido ao estado de sensibilidade extra em que fica a boca (grande possibilidade de hemorragias e por aí fora), é melhor prevenir. Mas o pior é que eu ainda não abria a boca em condições devido à cirurgia, quanto mais arrancar dentes. 

Mas, pronto, teve de ser e era por uma boa causa. Por isso, resignada e completamente em pânico, escancarei a boca.

- Ora vamos lá à anestesia. E cada vez que ele me espetava aquela agulha tão perto da garganta, ficava logo com vontade de vomitar. O pesadelo estava a começar.

O primeiro dente, do maxilar inferior, saiu num instantinho. Eu nem queria acreditar. Foi nessa altura que amaldiçoei todos aqueles que me tinham descrito autênticos filmes de terror. Quer dizer, tanta coisa, tanta história de faca e alguidar, e afinal era aquilo. Extremamente fácil. Malvados, pensava eu.

Quando começou o segundo, o caso mudou de figura. Foram tentativas e mais tentivas para arrancar o malvado, e nada. O médico puxava de um lado. O assistente de outro. E nada. E eu com os olhinhos fechados, apertava as mãos, uma contra a outra. 
De repente oiço o médico a dizer para o assistente: - Vai buscar-me a broca. Foi nessa altura que comecei a ver a minha vidinha a andar para trás. O dentista ia transformar-se num mineiro. O "capacete" com a luz já ele tinha. Foram brocas e mais brocas. E martelos. A minha boca parecia um bocado de terra a ser perfurada. 

E, no fim, pontos e mais pontos. Eu já nem estava em mim, já nem reagia. Estava apática. O bom disto é que quando pensei que ainda faltava mais um dente, já ele tinha saído cá para fora.

No final e com a boca comprimida por causa das gazes, fui ter com o dr Eduardo Neto como tinha sido combinado para então começarmos os procedimentos da radioterapia dentro de dias.

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Primeira consulta de radioterapia

No início de setembro de 2008, tive a minha primeira consulta de radioterapia. Médico novo para acompanhar todo este processo, procedimentos novos.

Antes de ir à primeira consulta, já eu tinha andado a cuscar sobre os possíveis efeitos secundários da radioterapia e não me tinham agradado por aí além. Se noutra zona do corpo poderá ter efeitos mais leves, sobretudo ao nível da pele, no caso da parótida a coisa muda de figura (é certo que os da efeitos secundários da quimioterapia são mil vezes piores, mas estes também não eram lá muito simpáticos).

Para além dessas dermatites (eritema, formação de bolhas, descamação e até necrose) comuns à radioterapia noutras regiões do corpo, os efeitos secundários da radioterapia na parótida podem ir de mucosites (boca cheia de feridas e afins), infeções fúngicas e bacterianas na boca, a xerostomia (boca seca, saliva mais espessa e viscosa e todos os males que daí advêm como a propensão para o aparecimento de cáries - sem poderem ser tratadas - e por aí fora), e queda do cabelo definitiva (nunca mais voltaria a nascer) na zona irradiada (nesta altura comecei a rezar para que a zona irradiada não apanhasse zonas do cabelo, ou pelo menos zonas do cabelo visíveis)...

O médico, o dr Eduardo Neto, não me escondeu nenhum deles. Disse que possivelmente eu iria ter de pôr baixa, pois iria ser complicado dar aulas a partir da segunda semana de tratamento, coisa que me deprimiu mais um pouco. Mas adiante.

O primeiro passo, era ir ao dentista. Não que precisasse na altura, mas faz parte do procedimento pré-radioterapia. Quando já estivesse despachada desse campo, iria lá ter com ele e dávamos então início a tudo.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Descanso merecido

Depois da cirurgia, foi sempre a melhorar. Sentia-me bem. Não tive muitas dores nos dias que se seguiram e comecei cedo a fazer a minha vida normal. Tinha o mês de agosto todo pela frente para descansar. E assim fiz.

O resultado da anatomia patológica do que se tinha retirado na cirurgia saiu e os resultados, segundo o meu médico, até eram animadores. Aquela zona da cicatriz tinha o tumor infiltrado, mas não havia gânglios à volta afectados. Graças a Deus.

O próximo passo, após recuperar bem da cirurgia, seria a radioterapia. No princípio de setembro, teria, por isso, a primeira consulta para todos os preparativos serem feitos. Eu estava bastante calma, positiva e otimista para mais essa etapa. E isso era o primeiro passo para que tudo corresse bem.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

A cirurgia propriamente dita

A cirurgia correu bastante bem, mas a coisa não estava tão fácil de tirar. Não fiquei com sequelas graves graças à equipa que me operou. Se tivesse sido noutro hospital, possivelmente a coisa teria sido bem mais grave. O tumor estava bem em cima do nervo facial e só mãos muito habilidosas e experientes conseguiram tirar o bicho sem que eu ficasse com sequelas graves. Ainda cortaram um pouquinho o nervo, o que me deixou com uma pequena parte do lábio inferior mais dormente, mas coisa pouca. Quando finalmente me disseram, fiquei muito feliz.


quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Depois da cirurgia

Quando, no dia 29 de julho de 2008, acordei definitivamente após a cirurgia, já eu estava na sala de recobro com visitas a falarem comigo. Sentia-me bem, mas, como nas anteriores cirurgias, com uma má disposição em cima que não lembrava a ninguém. Má disposição que durou até eu vomitar como se o mundo fosse acabar e o meu corpo ficasse ali prostrado (sinto-me sempre assim quando vomito). Depois fiquei ótima, dentro dos possíveis, claro. Recebi mimos de muita gente, mas os melhores foram, sem dúvida, os da minha mãe, que quando me viu desatou a chorar de alegria por me ver "bem" contrariando todos os medos que tinham povoado a sua cabeça naquelas horas de cirurgia.

À noite a coisa não foi tão fácil. Umas dores fortíssimas na cabeça e sono nem vê-lo. Lembro-me de ver passar todas as horas e lembro-me de ter lidado com as minhas insónias escutando as conversas dos enfermeiros que ali faziam turnos na sala de recobro. Parece que tinha havido um diz que disse entre eles. Uma tinha dito mal de um. O outro tinha sabido. E ali andavam eles a tentar resolver aquilo pela madrugada fora enquanto todos os doentes supostamente dormiam. Eu, claro, a fingir-me adormecida e na falta de melhor com que me entreter, ia dando largas à minha veia de cusca e ia-me deliciando com tudo aquilo.

Por fim, amanheceu..

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Já no bloco

Aquela altura em que entramos no bloco operatório é sempre estranha. Metade das coisas ficam para sempre esquecidas porque nos apagam com a anestesia e depois quando acordamos  fora do bloco já não nos lembramos de grande coisa. Mas eu lembro-me de duas coisas. Primeiro, lembro-me de ter estado a falar com uma rapariga que iria ser operada a um linfoma noutro bloco. Estivemos as duas à conversa e depois nunca mais a vi nem soube nada dela. Segundo, lembro-me de ter sido apaparicada ao máximo por internos e por toda a restante equipa e de ter escolhido a música "Everything" do Michael Bublé para "adormecer". Não me lembro de mais nada. A não ser de acordar por momentos a tremer de frio num corredor qualquer e de alguém me ter posto um edredão quentinho por cima.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Na véspera da cirurgia

Na véspera, tive de me apresentar no hospital para tratar de todos os procedimentos para a cirurgia.  Primeiro que tudo, a auxiliar que me recebeu começou a dizer cheia de boa disposição e em tom de brincadeira que eu me devia ir embora enquanto era tempo, porque aquilo não era sítio para uma rapariga tão bonita, tão nova e com um aspecto tão saudável. Era bom que assim fosse, mas infelizmente e apesar de não aparentar estar doente (em parte graças também à maquilhagem com que uma pessoa disfarça olheiras e afins), a verdade é que tinha dentro de mim aquela bicheza toda e eu só queria ver-me livre dela. Mas quando entrei naqueles corredores do quinto piso do IPO respirei fundo e vi que não ia ser de todo fácil.

O quinto piso que abrange a área dos tumores de cabeça e de pescoço não é de digestão fácil. É que uma coisa são os males que não são tão visíveis, outra são aqueles que não dão para esconder, a não ser que se esconda a cara. De repente, dava por mim a espreitar para aqueles quartos e só via pessoas sem partes da face, sem maxilares, sem narizes, outras que não podiam fechar a boca porque a língua estava gigante e cheia de cortes, outras com cicatrizes que iam de uma ponta à outra da cabeça e uma imensidão de gente com buracos no pescoço que lhes permitiam falar e comer, fruto de traqueotomias. Eu confesso que fiquei apavorada com todo aquele sofrimento.

A dra Mariluz Martins que me recebeu, e que é simplesmente do mais querido que há, disse-me para eu ficar tranquila e que nada iria correr mal. Iria ser operada pela melhor equipa do país neste tipo de tumores e as coisas só podiam correr bem. Tranquilizei, mas só pensava naquelas pessoas que ali estavam. Por que é que certas pessoas têm de sofrer tanto, pensava eu. Comparada com aquelas pessoas, sentia-me uma sortuda. Ou não. É que ali acabei por conhecer pessoas inspiradoras com vidas tão difíceis , mas que ao mesmo tempo mantinham uma alegria de viver tão grande, que me faziam sentir pequena em todos os aspectos. Foi, sem dúvida, uma lição de vida para mim tudo aquilo que ali vivi.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Como relaxar antes de uma cirurgia? Ir de férias para bem longe daqui!

A cirurgia ficou marcada para o dia 29 de julho. Tinha, por isso, cerca de um mês e meio pela frente. Até lá tinha de fazer uma série de exames pré-operatórios e pus na cabeça que também tinha de ir de férias para algum lado. Não sabia como, mas não queria estar a deprimir até essa data e, para além disso, o verão estava aí e depois da cirurgia já era impensável ir de férias. Os exames seriam feitos em junho e no princípio de julho teria a consulta de anestesia. Sobravam-me ainda alguns dias. Por isso, no dia 17 de julho cheguei à Tunísia (era dos únicos destinos que ainda havia disponíveis) com uma amiga e até consegui não estar sempre a pensar na cirurgia. Passei alguns dias na praia, estive dois dias no deserto do Sahara e até consegui relaxar. O problema foi voltar. Eu até tinha vontade de voltar para casa, mas só de pensar no que me esperava, tremia. Só me apetecia entrar em negação e ficar por lá eternamente como se não tivesse de enfrentar nada. Mas, pronto, lá voltei e que remédio tive eu a não ser preparar-me para a cirurgia.

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

O que se seguiria?

Nesse fatídico dia 11 de junho após receber aquela notícia, fui logo ter com o médico ao IPO. Ele estava a dar consultas e iria receber-me logo que eu chegasse. Assim foi.

As notícias não eram de todo as melhores. Iria fazer mais uma cirurgia. Desta vez com maiores riscos do que as anteriores, sobretudo no que dizia ao risco de ficar com grandes sequelas a nível do nervo facial, que é como quem diz, fortes probabilidades de ficar com um lado da cara sem movimento e sem expressão. Medo, era o que eu sentia. Depois da cirurgia, teria de obrigatoriamente fazer radioterapia. Outro medo. Resumindo, só me restava respirar fundo e rezar, rezar muito.

O cenário foi tão negro que as duas estagiárias que ali estavam a assistir à consulta até pediram para sair, pois estavam a sentir-se mal. Talvez por me terem visto tão nova a levar com aquela avalanche em cima. Mas o médico, com o seu otimismo e confiança, só me dizia que eu iria ficar bem. Tinha a certeza disso. E eu, apesar de tudo, acreditei.

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

O sol não brilhou

No dia 11 de junho de 2008, precisamente dois anos depois de ter sabido que tinha cancro, fiquei de ligar ao médico pela manhã para ele ver se o resultado já estava lá, e caso estivesse para me dizer o que fazer. Assim fiz.

Quando lhe liguei toda eu tremia, mas é verdade que tinha alguma esperança de que tudo não passasse de um susto. Mas isso não aconteceu. Os resultados eram claros, o cancro tinha voltado. E saber desta novidade foi ainda pior do que descobrir pela primeira vez que tinha cancro. Foi simplesmente horrível.

Depois disto senti que o cancro iria sempre voltar. Mas até quando iria eu resistir? Senti, por isso, que este seria o princípio do meu fim. O que me iria acontecer a seguir? Estava muito assustada.

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Da ansiedade

O dia da consulta para saber o resultado do exame chegou, mas qual o meu espanto quando o médico abre o meu processo no computador e do resultado do exame nem sinal. Tinha de esperar mais dois dias. Como dizia o outro, foi o drama, o horror e a tragédia. Seguem as palavras que escrevi, cheia de raiva, nesse dia 9 de junho de 2008 no "Amor é um lugar estranho".

E depois há aqueles dias em que não dormimos, não comemos, a pensar na consulta que vamos ter de manhã. Aqueles dias em que a ansiedade é tanta, que quase morremos, só de pensar no que o médico nos vai dizer (relativamente à citologia que fizemos na semana anterior). Depois vamos a ver, e o resultado nem sequer está lá. Mais dois dias de espera e angústia. Tragam-me, por favor, o saco de boxe. Estou com vontade de bater em alguém.


segunda-feira, 14 de outubro de 2013

A citologia aspirativa

Nunca tinha feito antes este exame, mas quando ouvimos o nome "citologia aspirativa" sabemos logo que não deve vir dali coisa boa. Mas eu estava por tudo. O que interessava mesmo era o resultado final.

Camada de nervos. O exame começa. Introduzem uma agulha na zona a analisar e retiram algo que depois é analisado.

Primeiro comentário do médico, enquanto retira as amostras: - Humm, parece ser apenas tecido inflamatório. E toda eu sou felicidade. Ah e tal, afinal não passou tudo de um susto, pensei eu naqueles segundos. Segundo comentário do médico, já bastante sério: - Humm, afinal já não parece apenas tecido inflamatório. Ao que eu pergunto: - Então o que parece? E o médico responde: - Só depois de bem analisado saberemos. E eu percebo que há algo de errado comigo.

Saí do exame de rastos. Sofri muito muito nesse dia. Saber que ia passar por tudo novamente, com tudo o que isso implicaria, não estava a ser fácil de digerir. Só me restava rezar, enquanto aguardava pelo resultado do exame, para que tudo não passasse novamente de um susto.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Novas suspeitas

Depois de meses sem pensar muito no maldito cancro e com momentos muitos felizes, como a minha primeira ida a Nova Iorque, a cidade que eu mais amo e onde quatro anos depois iria casar com o homem da minha vida (embora ainda não soubesse nesta altura que ele existia), chegou o mês de maio de 2008 e com ele chegaram novos exames.

Havia algo de estranho no ar e a minha intuição dizia-me que o pesadelo do cancro não tinha terminado. Tinham passado quase dois anos de ter feito a minha primeira cirurgia e se as pessoas me diziam que já podia começar a relaxar, a verdade é que eu sentia que não o poderia fazer. Além de que continuava a sentir uma zona da cicatriz bastante densa e grossa, talvez mais grossa do que antes.

Fui fazer a ecografia de rotina e o médico que me fez este exame achou que havia ali algo de estranho ao analisar essa zona. Disse que se por um lado parecia o tecido normal da cicatriz, por outro havia ali algo que deveria ser analisado através de uma citologia aspirativa. Fui logo ter com o meu médico que se encontrava a dar consultas e ele disse que era mesmo melhor, nem que mais não fosse para ficarmos descansados, fazer a tal citologia aspirativa nessa manhã. Lá fui eu,  meio atordoada.

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

O dia de saber o resultado dos exames chegou...

As dores de costas não passaram, muito pelo contrário, e eu comecei mesmo a achar que tinha metástases nos ossos. Foi um pesadelo. O dia de saber os resultados dos exames estava a chegar e eu andava na fossa.

Chegou o dia da consulta e o  médico abriu o meu processo no computador para ver os resultados dos exames, enquanto o meu coração disparava e eu ficava sem forças. A ecografia estava normal. Boa. A tac pulmonar também. Ótimoo. E a cintigrafia óssea também. O quêêê? A sério? Então mas eu não tinha mesmo metástases nos ossos? - perguntava eu mentalmente. Mas e aquelas dores de costas? Saí daquele gabinete 97 do IPO com um sorriso de orelha a orelha e com vontade de gritar ao mundo que estava feliz.

Escusado será dizer que depois desse dia as dores de costas passaram.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Ai que susto

Quando, depois da manhã passada no IPO a fazer exames, regressava à escola de carro para trabalhar, o telemóvel toca. Um número desconhecido. Atendi e era do IPO. Pânico total. Tinham descoberto algo grave e tinha de voltar lá, pensei eu naqueles segundos.

Não, queriam apenas dizer que eu tinha deixado lá um dos meus brincos (um dos brincos de um par que eu tinha comprado em Santorini no verão anterior e que eu adorava). Que queridos. É que com aquela camada de nervos com que eu saí do IPO, lembrava-me lá dos brincos. Respirei de alívio e prossegui o meu caminho.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Os exames

Estávamos quase no final de 2007, e, à semelhança do ano anterior em que também tive de ir ao hospital no dia seguinte ao meu aniversário, lá vou eu fazer os ditos exames ao IPO. A ecografia estava normal, embora se observasse uma zona densa na parte das cicatrizes. À partida, nada de preocupante. A tac pulmonar foi feita perante alguns olhares de pena dos técnicos. Isto porque sempre reparei que no IPO, os doentes mais novos, como era o meu caso, são sempre vistos dessa forma - Tão nova e já anda nisto?. E a cintigrafia óssea? A cintigrafia óssea era o meu maior receio nisto tudo.

Já há uns tempos que eu andava com algumas dores de costas. Não muito fortes, mas o suficiente para me incomodarem um pouco. Eu sempre pensei que fossem dores provenientes de más posturas, mas a verdade é que quando tive de fazer esse exame toda a minha cabecinha começou a matutar em coisas más. E se esta dor for provocada por uma metástase? Será o meu fim. E a verdade é que quanto mais eu pensava, mais a dor ficava forte e não passava.

Para fazer o exame injectam-nos algo na veia, temos de tirar brincos, relógios e tudo o que possa interferir, e temos de ficar uma eternidade de tempo deitados numa maca sem nos podermos mexer, enquanto a dita máquina passa a pente fino todos os nossos ossinhos, desde a cabeça até aos pés. É um exame demorado e que exige muita paciência e eu, embora tentasse pensar em coisas boas, só pensava no momento em que iria aparecer alguém naquela sala a dizer que tinham detectado cancro em algum dos meus ossos.

Saberia os resultados dos exames daí a cerca de duas semanas quando fosse à próxima consulta.

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

A primeira consulta no IPO

Quando o médico teve conhecimento do meu historial clínico deu-me logo conta de alguns "erros" que tinham sido cometidos comigo. Primeiro, antes de fazer a primeira cirurgia deveria logo saber se o tumor era benigno ou maligno, ou seja, deveria ser feita uma citologia aspirativa. Consoante o resultado desse exame, a cirurgia seria feita de determinada maneira, poupando-me, possivelmente, à segunda grande cirurgia. Segundo, eu deveria fazer sempre radioterapia, nem que mais não fosse preventiva, como seria no meu caso, uma vez que todos os vestígios de cancro tinham desaparecido. Mas por outro lado, por não ter sido feita a radioterapia, teríamos ainda essa "arma" caso o cancro voltasse a aparecer. Adiante. Decidi não pensar nos "e se" e decidi pensar como penso sempre - "tinha de ser assim".

Para começarmos do zero, novos exames tinham de ser feitos - ecografia cervical à zona das cirurgias, tac pulmonar e cintigrafia óssea. Estes dois últimos exames por serem o local preferido deste tipo de tumores para largarem algumas metástases. Que medo, era só o que eu pensava. Tac pulmonar tinha feito uns meses antes, mas e o exame aos ossos? E se tinha alguma coisa nos ossos? Eu até andava com dor de costas há uns tempos.

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Novo médico, doses redobradas de tranquilidade

Antes de ir à consulta do IPO, para onde a anterior médica me tinha encaminhado, já tinha ido conhecer o meu novo médico a uma clínica onde ele dava consultas. Pela primeira vez desde que me tinha sido diagnosticado carcinoma da parótida senti confiança num médico, aquela verdadeira confiança ao ponto de sentir que, acontecesse o que acontecesse, eu estaria em boas mãos. Percebi que ele realmente percebia do assunto como nenhum até aí me tinha demonstrado e isso já era meio caminho andado para uma doente de cancro se sentir segura.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

O IPO, esse bicho de sete cabeças

Sempre ouvi horrores do IPO e sempre tive uma imagem péssima daquele hospital. Não porque achasse que o hospital não funcionava bem, muito pelo contrário, mas porque imaginava um hospital triste, um hospital onde a maior parte dos doentes acabavam por morrer. Afinal de contas, uma pessoa ouve falar em cancro e pensa logo em morte. E todos conhecemos pessoas que ali acabaram por morrer depois de meses e meses de sofrimento. E se há coisa que eu temia - erradamente, claro, que hoje sei e tenho provas de que este é o melhor sítio para tratar cancros - era o dia em que teria de ir para o IPO. Esse dia chegou. Senti-me uma criança assustada que vai pela primeira vez para a escola e que teme tudo. Olhava para todas as pessoas que comigo se cruzavam e tentava perceber qual era o seu problema. Mas, para espanto meu, o IPO era um hospital como os outros e não aquele bicho de sete cabeças que eu criara na minha cabeça. Pessoas tristes, pessoas alegres, pessoas com mazelas visíveis, pessoas cansadas, pessoas tranquilas. Tudo como nos outros hospitais.

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Afinal não tinha passado tudo de um grande susto

Passadas umas semanas, o resultado chegou e as notícias foram boas. O gânglio retirado para análise era apenas inflamatório. Não havia qualquer vestígio de metástase. Afinal não tinha passado tudo de um grande susto. Mais um dia inesquecível e feliz.

 Mas a médica foi sincera comigo e disse que não tinha experiência em casos como o meu, coisa que eu tinha logo notado, e disse-me que conhecia a pessoa ideal para lidar com o meu tipo de tumor - o dr Carlos Zagalo, o médico que ainda hoje me segue, que eu admiro e respeito imenso e que trabalha no IPO. Desta forma, despedi-me do hospital de Santa Maria sem grandes saudades e preparei-me para enfrentar a realidade do IPO.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

A pedido de algumas leitoras

O The big C já tem e-mail:

mrskittyfane@gmail.com

Adeus, gânglio!

Passadas duas semanas da consulta, eis que me apresento novamente no Hospital de Santa Maria para aquela pequena cirurgia. Não implicava internamentos, apenas umas horas de repouso após a cirurgia. Logo que chego ao bloco operatório com uma daquelas batas horrorosas e quase pornográficas que, para além de nos deixarem o rabo de fora ainda são transparentes, sou abordada por uma enfermeira que me diz que a minha cara não lhe era estranha. Eu nunca a tinha visto mais gorda, mas informei-a de que uns meses antes ali tinha feito uma grande cirurgia. Foi então que ela se lembrou de quem eu era, ao mesmo tempo que fazia uma cara muito preocupada, do género - Depois daquilo, esta desgraçada já está aqui novamente? - Claro que se eu já estava nervosa, mais nervosa fiquei.

 A única vantagem de uma cirurgia com anestesia geral é a pessoa não presenciar a sua cirurgia, coisa que facilita em muito todo o processo e nos poupa a grandes camadas de nervos. Desta vez, eu estava acordada, em pânico e a presenciar tudo. Não gostei nada. Fiquei mal disposta, fiquei com as mãos dormentes e não me podia mexer, pois estavam a mexer no interior do meu pescoço. O gânglio nunca mais saía e eu desesperava cada vez mais. Aqueles quarenta minutos, mais coisa, menos coisa, pareceram-me uma eternidade. Por fim, o malvado viu a luz do dia, neste caso do bloco, e até me o mostraram antes de o guardarem para ser analisado.

 Saída do bloco, descansei durante algum tempo e regressei a casa. Passadas umas horas estava bem e sem dores. No dia seguinte fui trabalhar.